31 janeiro 2007

SOBRE PAIXÕES E A VIDA REAL


Eu já me apaixonei perdidamente várias vezes. A primeira vez foi pelo Paulinho. Eu tinha 11 anos de idade e ele tinha dez e meio. Na época, eu ficava arrasadíssima porque esses seis meses realmente o tornavam uma pessoa mais nova que eu. Ele era uma série abaixo da minha por causa desses malditos seis meses. Acreditem, cheguei a considerar a possibilidade de repetir o ano só pra ser da sala do Paulinho. E tudo era o Paulinho. Eu queria ir às festas que o Paulinho ia. Eu queria ir pro sítio onde o Paulinho jogava futebol. Eu queria freqüentar a mesma praia que o Paulinho. Meu Deus, eu nunca conheci ninguém tão perfeito quanto o Paulinho!

Aí, lá pelos meus 15 anos, teve o Cal. O Cal era um ano mais velho que eu e, conseqüentemente, estava um ano na minha frente no colégio. Até que a praga que eu roguei vingou e ele repetiu o ano. Caiu na minha sala. Eu chegava atrasada só pra assentar atrás dele na aula e ficava olhando aquele cabelo mel com aqueles pelinhos loiros na nuca. Meu Deus, o que era o Cal?! O homem da minha vida. O cara mais perfeito que eu já tinha conhecido no mundo. O Cal era descolado. Tinha 16 anos e andava de carro sem carteira de habilitação. Bebia até cair, em todas as festas. Tinha mais nicotina no pulmão do que cabelo no saco. Eu odiava isso tudo mas, ainda assim, achava o Cal o cara perfeito.

Daí, no alto dos meus 21 anos de idade, veio o Vitor. Um cidadão de 16 anos (isso mesmo, cinco anos mais novo que eu!). O Vitor era o cara mais popular da turma. Andava de carro tunado e eu achava aquilo o máximo. Ele me esnobava horrores e mesmo assim eu era apaixonada por ele. O jeito que ele me chamava de “lôra” me dava calafrios na espinha. O jeito que ele dirigia meu carro fazia meu coração ir de zero a 100 em seis segundos. O jeito que ele não me queria fazia eu querê-lo ainda mais.

Fora esses, ainda vieram vários caras perfeitos: o Henrique, o Camelo, o Boca e algum outro que eu não lembro mais. Mas só hoje eu percebo que o tal homem perfeito não existe a não ser na cabeça da gente. O Paulinho? Não passava de um menino riquinho e mimado. O Cal? Era um adolescente rebelde sem causa, sem documento e sem um pai que o parasse. O Vitor? Era um pirralho galinha, pegava todas as breguetis da cidade e, hoje em dia, deve ter todas as DSTs que a medicina já descobriu. Ah, e aquele carro rebaixado dele era baranguérrimo.

Tudo é perfeito quando a gente está apaixonado. Ninguém tem defeito. A distância não importa. A sogra é gente boa. O cunhado é “parceiro”. A gente sai de casa cansado depois do trabalho. A gente freqüenta festa de tia-avó achando ótimo. Aquele tênis verde arregalado que o cidadão usa é lindo. Aquela camiseta regata realça os braços fortes dele. Tudo é lindo. Até que o tempo passa e você percebe que o trajeto de 670km da cidade dele até a sua tá foda de agüentar. Que a passagem de avião é muito cara pra você ir toda semana. Que num ônibus você não entra nem amarrada. A sogra é uma amélia. O cunhado é um mala. Você está muito cansado sexta-feira à noite e sair que nada! Você acha que a tia-avó já passou da idade de partir dessa pra melhor. Aquele tênis verde arregalado deve ser coisa de camelô porque não existe nada mais brega no mundo e, pelamordedeus, o que é aquela regata??? De onde ele tirou que pode usar regata, ainda mais com aqueles braços brancos da cor da parede da sua casa?

Dizem que o amor é cego, mas não é, não. A paixão é que é. A paixão deixa a gente meio idiota mesmo. Depois vem o tempo, joga um balde de água e coloca um par de óculos na cara da gente e a gente começa a enxergar as coisas do jeito que elas realmente são. Acho que quero me apaixonar pra sempre. Passar um tempo idiota e voltar ao normal. Idiota. Normal. Idiota. Normal. Idiota. Normal. Idiota. Normal. Idiota. Normal. Só espero que eu termine a jornada normal. Ah, não! Quero terminar idiota!

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Devo lembrar, mais uma vez, que os textos aqui publicados são obras de ficção. No entanto, qualquer semelhança com a realidade não terá sido mera coincidência!

24 janeiro 2007

O TEMPO DA SUA VIDA


Você termina seu namoro de longa data. Você chora até secar os setenta por cento de água do seu corpo. Você sai na rua e olha pra placa de todos os carros iguais ao dele pra ver se é o cidadão. Com o coração do tamanho de um pistache sem casca. Querendo vê-lo mas, no fundo, morrendo de medo de vê-lo com outra. Será que ele está com alguém? Será que está namorando? Será que está pegando todas nos axés e micaretas por aí? Você não faz a mínima idéia de como ele está. Se mudou de emprego. Se deu certo aquele projeto pelo qual você estava torcendo. Se ele voltou a fumar. Se ele continua falando aquele inglês com sotaque californiano (lindo!). Você simplesmente não tem mais notícias dele. Daquele cidadão que era o mundo pra você. Daquele cidadão que foi pro hospital chorando no seu colo e fez você chorar junto por medo de perdê-lo.

Seu mundo caiu. Você ficou sem chão. Você ficou sem o amor da sua vida que agora vai ser o amor da vida de alguma outra por aí. Você ficou sem aquele cidadão que acreditava em você mais do que você mesma. Que acreditava nos seus projetos profissionais quando você mesma não tinha sequer uma pista de que a coisa ia dar certo. Na verdade, você ficou sem a outra parte de você. Arrancaram seu coração e você não acreditou que conseguiria sobreviver sem ele.

Recomeçar sozinha não é tarefa das mais fáceis. Você chora na volta pra casa depois da melhor balada. Você chora no dia dos namorados que você passa sozinha. Você chora no dia do seu aniversário que ele não está presente. Você chora simplesmente porque o coração aperta e está vazio. Você chora porque sente a falta e não queria sentir, porque gosta dele e não queria gostar, porque agora você não tem mais pra quem ligar no final do dia e jogar conversa fora. Você chora porque é domingo e está chovendo e está muito mais frio do que estaria se ele estivesse do seu lado.

Então, sua vida anda. Você não encontrou outro cara bacana. Ninguém substituiu o lugar de amor da sua vida. Você agora é quem mais tem que acreditar em você e nos seus projetos. Você não tem mais por quem chorar, o que, de certa forma, é bom porque você não agüentava mais aquele chororô. Você não precisa dar satisfação se quer viajar pra praia ou se simplesmente quer ficar em casa sozinha sem fazer nada. Você aproveita as tardes de domingo chuvosas pra ler um livro e relaxar a cabeça. Aproveita também pra descansar o corpo daquela noite de sábado quebradeira que durou até às oito da manhã. Ninguém vai te ligar meia-noite só pra te desejar boa noite então você pode estar em qualquer lugar do mundo e com o celular desligado dentro da bolsa sem te xingarem depois. Você pode ter quantos amigos homens quiser sem ninguém te encher o saco porque fulano ou sicrano te liga demais. Você pode ficar na piscina sábado à tarde com seu vizinho saradíssimo sem ser importunada por telefonemas do tipo “você está aí com quem?”.

Até que, um belo dia, sua vida, que havia andado, te joga um laço, te golpeia pra trás e coloca aquele cidadão na sua frente de novo. Ham??? Como assim, cara pálida? O tempo passou. Você mudou. Sua vida mudou. Seus projetos mudaram. Você deu um passo à frente. Você cresceu e se transformou em você inteira. Uma versão completa de si mesma. Você deu conta da sua vida muito bem sozinha. Você passou a acreditar mais em você do que em qualquer outra pessoa. E agora é tarde demais quando ele diz que quer voltar. Você já descobriu que voltar é retroceder. Andar pra trás. E essa sua nova versão jamais permitiria isso.

16 janeiro 2007

O GRANDE MOMENTO

A gente está sempre esperando um grande acontecimento pra ser feliz. Faltam 29 dias pra num sei o que... faltam 16 dias pro meu carro novo chegar... faltam 28 dias pra eu chegar ao peso que eu quero... faltam seis dias praquela festa... faltam num sei quantos dias pro Fat Boy. Que porra é essa? Por que é que a gente tá sempre esperando algo de muuuuuuuuuito importante acontecer na nossa vida e nada muda depois do graaaaaaaaaaaande acontecimento? Ninguém sabe. O que a gente sabe é que vivemos sempre esperando um grande acontecimento e nada acontece depois dele. Haja vista que, logo no dia seguinte, começamos a aguardar ansiosos pelo próximo evento. E quando é que vamos ser felizes de fato?

Estamos sempre esperando pela viagem da nossa vida, pelo reveillon da nossa vida, pelo carnaval da nossa vida, pela festa da nossa vida, pelo show da nossa vida, quando, na verdade, nossa vida acontece é entre um final de semana e outro, entre umas férias e outras, entre uma festa e outra. Essa espera do que vem pela frente só cria a ilusão de que a gente tem alguma coisa pra esperar. Algo de muuuuuuito importante está pra acontecer e precisamos estar aqui pra viver isso. E a gente vai vivendo enquanto isso. Vai levando a vida naquele emprego que a gente não gosta. Ficando com aquele ficante mais ou menos. Namorando com aquele carinha que já encheu o saco. Morando naquela cidade onde nada mais te surpreende. Freqüentando os mesmos lugares com as mesmas pessoas e os mesmos prazeres repetidos. Será que a gente tem mesmo que viver nessa sensação de que a gente está sempre na fila?

Sei que esse papo é muito antigo. Mas tão antigo quanto esse papo é essa espera infinita de uma coisa que nunca chega. O que é isso que criaram na cabeça da gente? Você só vai ser feliz se tiver 1,78m e pesar 50kg. Se sua bunda não tiver nem uma sombra de celulite. Se seu cabelo não tiver um fio fora do lugar. Se sua calça for Osklen e seu tênis, Nike. Se você tiver o carro do ano. Se sua internet tiver uma conexão de um milhão de mega bytes. Se seu celular for o último lançamento do mercado (daquele modelo que filma, tira foto, vira cambalhota e dá tchau quando o ladrão te rouba). Se você fizer a dieta da nova loira-burra do momento. Se você só comer alface (orgânico, claro). Se seu corpo for igual ao daquela arreganhada na capa da Playboy (com Photoshop até lá onde vocês estão imaginando). Ou se você estiver pegando a boazuda do momento. Ah, me poupem!

Por que é que ninguém fala do que realmente dá prazer na vida? Não contaram pra gente que beijo na boca é melhor do que MC Donald’s. Que a comida feita por quem a gente gosta é melhor do que qualquer fast food. Que estar com quem a gente ama é melhor do que fazer compras no shopping. Que festa com os amigos é melhor do que aquela multidão no show da banda de hip-hop do momento no meio da praia de Copacabana. Ninguém conta pra gente que o que a gente come com prazer não engorda. Ninguém conta pra gente que homem não gosta de mulher-esqueleto. Que mulher não gosta de homem-bomba. Ninguém me contou nada disso. Ninguém vai te contar.

Não adianta pensar que sua vida vai mudar porque você passou o reveillon de preto ou de branco ou sem roupa. Dormindo ou acordado. Na sua casa ou em Paris. Óoooobvio que eu queria passar o reveillon em Paris. Óoooobvio que eu quero ter o corpo da Cicarelli e o carro do ano. Óooobvio. Mas é óoooobvio que eu não vou viver em função disso. Eu só não agüento mais ter amigas infelizes porque não têm dinheiro pra festa tal. Que não vão à praia porque não têm o corpo de não sei quem. Ou frustradas porque não estavam numa suuuuuper festa quando o ano aumentou um dígito. Qual é?! Vamos curtir o sol, vamos ao cinema, vamos comer muita pizza. Vamos comer chocolate sem culpa. Vamos colocar biquíni e nos sentir a Gisele Bündchen. Vamos trabalhar naquilo que nos dá prazer. Vamos viver todo dia sem esperar que a vida aconteça no final de semana ou no carnaval. Nossa vida tá acontecendo agora. E todo dia deveria ser uma festa pra comemorar esse grande acontecimento.

09 janeiro 2007

UM 2007 MAIS E MENOS

Cheguei a fazer uma lista das coisas que eu queria pra 2007. Sério. A lista parecia de uma criança de sete anos pedindo coisas pro Papai Noel: “mais dinheiro, mais gente bonita no mundo, mais homens em Belo Horizonte, mais festas bacanas, mais sol, mais piscina, mais praia, mais caipi-saquê” e mais uma infinidade de “mais”. Rasguei. Tava tudo errado. Ninguém precisa sempre de mais. Tem hora que a gente precisa é de menos. O cabelo da minha vizinha, pelamordedeus, menos loiro. O vizinho da vaga ao lado, menos barbeiro. O vizinho do décimo primeiro, menos gato. A namorada do vizinho do décimo primeiro, menos visitas ao prédio. O vizinho do quarto andar, menos álcool. Não tem jeito. Algumas coisas precisam ser menos. Então, nessa confusão de mais e menos, acabei fazendo outra lista. A lista de 2007 agora é bem mais e menos.

Menos mentiras e mais caráter. Menos vaidade e mais conteúdo. Menos playboys e mais homens. Menos festas e mais diversão. Menos futilidade e mais utilidade. Menos histórias e mais coerência. Menos bolsadas e mais beijo na boca. Menos dinheiro e mais valores. Menos aparência e mais realidade. Menos passado e mais agora. Menos barulho e mais música. Menos drogas e mais viagens. Menos roupas e mais sexo. Menos gente e mais intimidade. Menos conversas e mais atitude. Menos rolos e mais certezas. Menos poluição e mais praia. Menos hipocrisia e mais pessoas felizes. Menos correria e mais tesão. Menos advogados e mais surfistas. Menos dietas e mais chocolates. Menos cartões de créditos e mais cartas de amor. Menos contas pra pagar e mais livros. Menos auto-afirmação e mais auto-estima. Menos conselhos e mais sabedoria. Menos pressa e mais qualidade. Menos padrões de beleza e mais amigas felizes. Menos padrões e mais beleza. Menos neuroses e mais prazer. Menos pose e mais desejo. Menos meninas querendo ser modelos e mais pessoas preocupadas em ser gente. Menos mulheres mostrando os peitos e mais mulheres de peito. Menos revistas de fofoca e mais livros da Martha Medeiros. Menos eu e mais todo mundo. Menos BH e mais o mundo.

Tem jeito???